Para a Isabel, para o Pedro e para o Vitorino.
Hoje, quando vinha para casa, deparei-me com o seguinte cenário, perto da Av. Miguel Bombarda: um homem já idoso, sentado desajeitadamente no chão da rua, bengala tombada sob a perna, já tinha sangrado bastante do nariz (tinha certamente caído). A seu lado, sentada no chão, uma rapariga, inexcedível na assistência, tentava ajudá-lo a marcar um número no telemóvel, enquanto umas cinco ou seis pessoas que os rodeavam – já inteiradas do estado aparentemente não muito grave do homem – aguardavam pacientemente.
Às tantas, começa-se a ouvir uma sirene. Momentos depois, surge no horizonte a silhueta amarelo-azulada da ambulância. Três ou quatro pessoas começam desde logo a acenar, para sinalizarem à dita a presença do "seu" doente.
Chega ao local, pára na esquina mesmo ao lado do doente e da sua acompanhante de ocasião, e de lá de dentro saem duas raparigas: a tripulante, de luvas de látex já na mão, e a médica, de mala à tiracolo. Dirigem-se de imediato, em passo firme mas calmo, ao doente, e começam a fazer-lhe as primeiras perguntas, essenciais para tentar entender o sucedido e, depois, agir como poucos sabem.
A partir deste ponto, segui caminho. Tive a certeza de que este homem já estava nas melhores mãos possíveis.
Há uns anos, tive a sorte de conhecer uma "equipa" de malta muito fixe, beirã, que me mostrou, digamos assim, o INEM. Ou seja, uma realidade até aí perfeitamente desconhecida para mim.
A ideia que tinha do INEM era a normal, digamos: médicos e enfermeiros de urgência, a voarem baixinho para tentar chegar a tempo de salvar uma, ou mais, vidas.
Foi então que ouvi falar, pela primeira vez, no CODU – Centro de Orientação de Doentes Urgentes – o centro de onde toda a sua actividade é guiada. Na altura, ainda só havia centros de emergência médica talvez apenas nas principais cidades do país. As VMER – Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação – eram uns VW Golf TDI completamente artilhados (lindíssimos!), e havia julgo que três helicópteros em outras tantas cidades do país.
Ouvi imensas histórias de "saídas" absolutamente incríveis. Desde malta que, de tão estoirada que estava (de saídas seguidas numa mesma tarde – ou noite, já nem me recordo bem…), até conseguia adormecer dentro do carro em marcha de emergência, com as sirenes a berrarem no máximo e as janelas abertas, devido ao calor (!!!), até uma de um tripulante de âmbulância que, por falta de alternativas expeditas, resolveu fazer, em plena hora de ponta, a Fernão de Magalhães, em Coimbra, em contramão!
O John Ford, julgo que n’ "O Homem Que Matou Liberty Valance", dizia algo do género: "Quando a ficção ultrapassa a realidade, publique-se a ficção". Pois neste caso, parece ficção, mas não é.
Outras histórias ouvi que eram bem mais dramáticas, devo dizer. O que é perfeitamente normal, nestas situações.
Entretanto, o Tempo encarregou-se de melhorar substancialmente as coisas – o que nem sempre acontece, como sabemos. E hoje já temos, para bem de todos, o INEM mais espalhado pelo país. As VMER também evoluíram – já são uma carrinhas VW Passat’s, ou Scenic’s – e até já vi médicos do INEM a saírem de mota para acudir um doente!
É claro que ainda acontecem cenas como aquela conversa telefónica que ouvimos aqui há uns meses largos… Mas o fundamental que retive, e retenho, de tudo isto é que, mesmo em condições difíceis – alguns destes "meus" bravos, por exemplo, acumulavam turnos destes com os respectivos trabalhos nos hospitais, e às vezes de seguida! – aquela (e esta, de hoje, também, claro está!) malta do INEM, que até parecem pessoas comuns, dá tudo por tudo pelos doentes. Mesmo!
Acho estes tipos absolutamente fantásticos, devo dizer!
E olhem que não ganho comissão nenhuma com esta prosa… :)
Escolhidos a dedo, adoram certamente a adrenalina destas situações. Mas também agem com uma precisão, calma e destreza que não devem ter igual! A este nível, talvez apenas os bombeiros – com quem, de resto, trabalham em colaboração – e alguma da nossa polícia (também temos bravos nestes campos, caso não saibam).
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Aqui há uns anos, numa aflição que tive com o meu Pai, pude comprovar muito do que aqui escrevi, apesar do nervosismo óbvio da situação toda – a espera (que não foi longa, diga-se, mas que pode muito bem sê-lo, infelizmente), a chegada, a calma na abordagem à situação, o encaminhamento da coisa e a ida para o hospital. Felizmente correu tudo pelo melhor.
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Hoje, a queda daquele homem, o apoio que recebeu de meros transeuntes (a rapariga que o amparou… Meu Deus! Um espectáculo!) e o seu posterior acolhimento e tratamento por esta malta da emergência médica – uma autêntica "tropa de elite" da Saúde, digo eu! – trouxe-me de novo à memória estas e outras histórias, de que aqui nem falei.
Acho que não será difícil concluir que, apesar de tudo o que nos mostram de mau que acontece aí fora, ainda há coisas que funcionam. Podiam funcionar melhor, é certo. Mas funcionam.
Quando aquelas VMER’s aparecem – para tentar parar o Tempo, e fintar algum Destino que pareça estar traçado – talvez seja Deus que vai a caminho.
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2 comentários:
Meu Deus....
Obrigada AMIGO (com letra muito grande), já há muito que não me emocionava tanto. É bom ler que alguém realmente compreende o nosso trabalho, significa que a mensagem está a passar. Dá vontade de trabalhar ainda mais e melhor!
Um beijo no coração, és um espectáculo
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